quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Partidos políticos versos democracia


“A política encontra-se em crise. Provavelmente sempre esteve, ainda que de formas diferentes…”
Rafael del Aguila




O sistema político é suportado, particularmente, por partidos políticos, cabendo-lhes aprofundar e gerir a democracia interna, para de seguida transportá-la para fora da esfera partidária (instituições em geral…)

Os partidos políticos são sempre necessários em qualquer sociedade como garante da funcionalidade do sistema democrático. Sem a sua existência o sistema não pode ser plural, factor sine-qua-non para um sistema político democrático.

O MpD, enquanto movimento, criado em 1990 após a abertura política dada pelo governo da primeira República, trouxe mudanças políticas indispensáveis à implementação de um regime pluripartidário em substituição do monopartidário, existente em Cabo verde, desde a independência - 1975.

Com a oficialização da UCID na sociedade Cabo-verdiana e com a criação de novos partidos, como o PCD, o PRD, o PTS e o PSD, o sistema partidário tornou-se mais interessante e competitivo, essencialmente nos períodos eleitorais.

Com excepção da UCID, todos os outros partidos acima referidos foram criados num período recorde de menos de cinco anos, o que demonstra o dinamismo e o entusiasmo da sociedade cabo-verdiana nessa matéria. Essa acção acelerou o processo de consolidação da democracia. Considerando que não existe democracia perfeita, pode-se apreciar que, graças a essa movimentação, a democracia cabo-verdiana está consolidando.

A alternância do poder é uma forma de exercício de democracia, como forma de não perpetuar no poder… e isso tem ocorrido na nossa Republica, fruto da assimilação dos valores democráticos por parte dos eleitores.

A sociedade cabo-verdiana tem assistido mudanças nas políticas de governação dos dois partidos que já assumiram os respectivos governos, mas quanto aos sistemas de partido, não têm apresentado nada de novo aos cabo-verdianos. Têm havido apenas imitações. Um dos dois principais partidos ao realizarem a sua magma assembleia (Congresso ou Convenção), apresenta algumas mudanças partidárias, ainda que seja cópia dos anos anteriores, o outro ao realizar a sua assembleia, não inova em nada, limita-se a plagiar as acções do primeiro e acrescentar mais algumas. Na assembleia seguinte o plagiado faz o mesmo: copia o resto e cria (?) mais algumas, para ser imitado na assembleia seguinte. Exemplo disso é o facto do MpD ter criado a figura de Presidente do Partido e o PAICV ter feito o mesmo. O mesmo aconteceu em relação a figura de vice-presidentes e agora com a eleição directa do Presidente do partido pelas bases (de facto essa forma de eleição é mais democrático, mas o mais concebível seria realizá-las no mesmo fim-se-semana que estivesse a decorrer a magma assembleia, como forma de não abrandar o entusiasmo dos militantes e nem tornar o presidente eleito arrogante a ponte de chegar no congresso com listas fechadas, não deixando hipótese dos congressistas participarem com propostas de nomes para os órgãos nacionais do seu partido. Aliás, em nenhum sistema partidário parece saudável apresentação de candidatura singular, ainda por cima com listas fechadas, como aconteceu nessas ultimas magmas assembleias do MpD e do PAICV).

Há pouco mais de um ano o MpD realizou uma Convenção com três candidatos. Fizeram um esforço interno para mostrar que estavam unidos a volta do mesmo projecto, mas a realidade mostrou que afinal essa união era de pouca dura. Era apenas sofrer uma derrota num ciclo eleitoral, para mostrar a outra face da moeda: mandar o presidente para casa e sacrificar o partido com a apresentação de uma única candidatura, suportada com lista única.

Algo semelhante terá acontecido com o PAICV. Após muita confusão na escolha de cabeças de listas para as legislativas em vários círculos eleitorais, o partido saiu vencedor e formou o governo. Passado oito meses, realizou, agora, o seu XI Congresso com uma única candidatura, suportada, também, por uma lista única, fechada (?), talvez como forma de mostrar a coesão dos membros do partido a volta do seu líder.

Ambas magmas assembleias trouxeram algo de novo: O Líder eleito do MpD não dividiu o poleiro, afastou os vice-presidentes e correu com as grandes figuras daquele partido dos órgãos nacional. O PAICV tinha dado um passo em frente em relação ao seu rival com a criação das primárias para as eleições dos órgãos autárquicos, desta vez eliminou-as para as Assembleias, passando doravante a realizarem primarias apenas para as Câmaras Municipais, onde houver mais do que um candidato interessado. Diminuiu, neste caso, a democracia interna. Agora já deu mais um passo, abertura à sociedade civil. O MpD agora tem duas imitações para fazer na próxima convenção, resta saber o que trará de novo, para ser plagiado pelo outro.

Interessante é que tanto na convenção do MpD como no Congresso do PAICV houve várias intervenções a discordarem das listas fechadas, mas até em relação a isso o presidente eleito e o candidato do MpD e do PAICV, respectivamente, tiveram a mesma postura: não abriram mãos das suas listas, com justificações que não convenceram aos delegados.

O receio que abarca no seio dos membros desses partidos, e, de certa forma, na sociedade em geral, é de, em nome da humildade, estabilidade e coesão dos dois maiores partidos cabo-verdianos que alternam a governação do país, os presidentes se transformarem em “pequenos reis” impondo as listas, que muitas vezes não servem nem os partidos nem o País, considerando que é desse grupo que sai a maioria dos governantes do país, tanto no governo como nas câmaras municipais e chefias intermédias.

Não podemos retroceder no tempo nem no processo democrático. A democracia deve ser consolidada. Os partidos políticos continuarão a dar um grande contributo nesse processo, se não nos conformarmos com o conseguido até agora. Temos de continuar a debater ideias e a encontrar soluções para novos problemas que continuarão a confrontar-nos no dia-a-dia. Mas para que isso aconteça não podemos aceitar chantagens de nenhum candidato (independentemente da sua aceitação no seio do partido e/ou da sociedade) de, ao ser confrontado com criticas, ameaçar retirar a sua moção de estratégia. Por isso, é sempre conveniente apresentar listas alternativas, independentemente do partido estar coeso ou não.
Na justificação da sua lista (fechada), o candidato a presidência do PAICV, Dr. José Maria Neves, recordou aos congressistas que para (…) trabalhar a que haver quem preparar as sapatinhas. Infelizmente, muitas vezes, aqueles que realmente preparam as sapatinhas são esquecidos, em detrimento dos engraxadores, aqueles que “ta pápia sabi”, que estiveram a espreitar o herdeiro do poder até 2001 e que após a vitoria do PAICV militarem nesse partido (isso aconteceu num dos concelhos numa ilha do Norte do país, em que em 2001 dois irmãos estiveram a fazer campanha, um para o MpD e o outro para o PAICV, sem serem militantes. Com a vitória do PAICV aquele que estava do lado do partido vencedor aproveitou de preencher o seu cartão de militante e o outro que estava com o MpD fez o mesmo dias depois, claro no PAICV (talvez a estratégia era isso. Nenhum ficava de fora. O partido vencedor das eleições ganharia os dois irmãos). Agora um está no governo e o outro é líder local do partido que sustenta este governo. Imaginem se essa moda de estar na política pegar). O candidato a presidência do partido esqueceu-se de recordar que quem teve coragem de fazer uma sapatinha na década de 90, sob todo o tipo de retaliação do partido no poder, se encontrasse oportunidade agora que o seu partido está na governação, oxalá, construiria dez ou vinte...

Um cidadão atento com o que se passa no país que ajudou reconstruir e que está a ajudar a transformar.
manuelsmota@hotmail/gmail.com
Praia, 17/10/2006


Publicado pelo jornal asemana em 03/11/2006

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